Esporte

Fifa multa CBF por causa de gritos homofóbicos em jogo do Brasil

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A Fifa divulgou, na manhã desta terça-feira (4), que multou a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) em 20 mil francos suíços (cerca de R$ 65 mil) por causa de gritos homofóbicos de torcedores durante a partida entre Brasil x Colômbia, na Arena Amazônia (Manaus), pelas eliminatórias da Copa do Mundo. No jogo, disputado no dia 6 de setembro, torcedores gritavam “bicha” quando o goleiro adversário iria cobrar um tiro de meta.

A punição faz parte de um programa da Federação Internacional de Futebol contra a discriminação racial e social no esporte. Com o apoio da OnG Fare Network, a Fifa monitora e tem multado confederações por atos racistas e homofóbicos. Esta foi a primeira vez que a entidade brasileira foi punida por homofobia.

“A Comissão Disciplinar da FIFA emitiu seu veredicto depois de analisar as circunstâncias específicas de cada caso, em particular, os processos de arbitragem, a posição da federação (se for o caso) e o relatório do grupo de observadores antidiscriminação e as evidências disponíveis. Em alguns casos, também levaram em conta alguns atenuantes, como os esforços feitos pelo membro para sensibilizar os espectadores e federações combater a discriminação”, apontou o comunicado.

Além da CBF, entidades de Honduras, Albânia, El Salvador, Itália, México, Peru, Paraguai, Argentina, Canadá e Chile levaram multas de 20 mil a 65 mil francos suíços. O Chile também perdeu um mando de jogo. A seleção não poderá jogar no Estádio Nacional na partida contra a Venezuela, em março de 2017.

A OnG Respeito Futebol Clube tem tentado, desde o início deste ano, conversar com torcedores para que os gritos de “bicha” cessem em estádios. No manifesto do movimento, a ação foi criticada.

“Os amantes do futebol podem fazer algo diferente. O mesmo esporte que serviu de difusor da democracia no país tem força e peito para fortalecer a defesa da diversidade, o meio-campo do diálogo e o ataque ao preconceito”, aponta.

Para a jornalista Ana Clara Ferrari, que coordena a OnG, ações como a da Fifa são exemplares, mas não são suficientes para acabar com a discriminação. “A punição aponta para uma diretriz de que a instituição não tolera mais homofobia. Mas para ações ter efeito mais prático, é preciso uma relação mais direta com a torcida. Por exemplo, se torcedores gritassem, por que não um jogador do time da casa pedir para parar com os gritos? Imagine o impacto se, por exemplo, o Neymar se posicionasse em relação a isso?”, diz.

A reportagem tentou entra em contato com a CBF, mas não conseguiu até o final desta matéria.

movimento discute racismo, machismo e homofobia no futebol

28/03/16

Com o intuito de tornar o estádio de futebol o “lugar mais democrático do mundo” e combater atos de racismo, machismo e homofobia no futebol brasileiro, um grupo de jornalistas se reuniu e resolveu criar o movimento Respeito Futebol Clube.

O movimento surgiu após a jornalista Ana Clara Ferrari presenciar torcedores hostilizarem o colega de profissão Mário Marra por ele ter feito críticas à apresentação de mulheres com roupas íntimas durante lançamento dos novos uniformes do Atlético (MG), em fevereiro deste ano. Também participam do movimento, os jornalistas Marco Aurélio Carvalho, Renata Mendonça, Wagner Prado e a ex-jogadora Juliana Cabral.

De acordo com Ferrari, uma das organizadoras do movimento, o futebol deveria ser utilizado para superar diferenças e não para acentuar preconceitos: “No Brasil, temos uma noção de que o futebol é democrático e a paixão pelo time cria um ambiente de superação de diferenças. Só que o que temos visto no nosso país é exatamente o contrário. É a propagação do preconceito, do racismo, da homofobia, do machismo”.

Ferrari aponta que a lógica do “pode tudo” beneficia a propagação de xingamentos preconceituosos em estádios, mas pune manifestações políticas. “Pode xingar o goleiro adversário ou gritar ‘tesão’ para uma mulher. Mas se uma torcida for fazer uma faixa contra a corrução ou questionar instituições como CBF ou Fifa, ela é sumariamente calada. O ‘pode tudo’ vale só para alguns”, afirma.

Para o jornalista Marco Aurélio Carvalho, é preciso que as pessoas se conscientizem do mal que o racismo, o machismo e a homofobia no futebol causam à sociedade e ao esporte. “O futebol é movido por paixão e é difícil acabar com o descontrole e o xingamento. Mas nós queremos o fim do racismo, do machismo e da homofobia. Com isso é possível acabar”, disse Carvalho durante entrevista para o programa Bate-Bola Nacional.

1ª reunião

Na última terça-feira (22), o grupo fez a 1ª reunião. Participaram cerca de 40 pessoas entre jornalistas e pesquisadores da área do esporte além de membros de entidades e organizações. “Tratamos dos três temas de forma mais geral neste primeiro encontro. Mas devemos realizar mais três encontros em São Paulo. Um sobre racismo, um sobre machismo e um sobre homofobia”, diz Ferrari.

O grupo também vai realizar encontros em outras capitais. Até o meio do ano, o Respeito Futebol Clube deve realizar debates em Belo Horizonte (no final de abril) e no Rio de Janeiro (sem data definida). No primeiro encontro foi assinado um manifesto, que pode ser lido abaixo:

RESPEITO FUTEBOL CLUBE: UM GOLAÇO DA DEMOCRACIA

Futebol é uma das maiores paixões do brasileiro. Nem sempre o melhor vence. Por mais talento que o jogador tenha, invariavelmente dependerá do trabalho coletivo. A baixinha e franzina pode ser mais útil taticamente que a jogadora alta e musculosa. Dois chinelos de dedo de cada lado e… Pronto! Cancha de jogo.

A paixão pelo time une gerações, credos, gênero, etnias e classes sociais. Há quem diga ser o maior exercício de democracia que a história conhece.

Futebol, do campo à arquibancada, é verve. “O gol é como um orgasmo”, dizia o Doutor Sócrates, talento da Seleção Brasileira. “É grito sufocado de um povo sofrido”, destacava Osmar Santos nas narrações dos gols em plena ditadura. É catarse.

Na arquibancada, o torcedor se sente livre. Com poder. Sente que pode tudo.

Todos podem tudo? O negro reclamar dos gritos de “macaco”, pode? Tornar as leis mais rigorosas contra o racismo no futebol, também pode ou fica “chato”? Há quem faça cara feia pra mulher que joga, apita, comenta, faz reportagens de campo, e muito mais. E reclamar do machismo no futebol, vale? As ofensas contra gays e lésbicas ainda são aceitas como naturais. Quando o coletivo não é sinônimo de diversidade, é mesmo coletivo?

O estádio, que muitos ainda chamam de “o lugar mais democrático do mundo”, tem se transformado num palco de intolerância e desrespeito.

Os preconceitos, muitas vezes reprimidos lá fora, são escancarados na arquibancada e nos bastidores do futebol. Que tipo de democracia é essa?

O “vai tomar…” contra a chefe de Estado na Copa do Mundo foi dito sorrindo, enquanto a faixa contra corrupção foi reprimida com violência.

Do barulho com as imitações de macaco para o goleiro Aranha aos gritos de “gostosa” ou de “volta para a cozinha” para a árbitra, a bandeirinha, a torcedora, a jogadora… Do grito de “oooo bicha…” no tiro-de-meta” à má vontade com as comentaristas…

Os amantes do futebol podem fazer algo diferente. O mesmo esporte que serviu de difusor da democracia no país tem força e peito para fortalecer a defesa da diversidade, o meio-campo do diálogo e o ataque ao preconceito. E estamos prontos para fazer, com vocês, belas jogadas nesse campo.

Nós do Respeito Futebol Clube – jogadores, jornalistas, torcedores, árbitros e amantes do futebol -, sem distinção de raça, gênero ou orientação sexual, estamos aqui para construir um novo time. Onde podem ser escalados milhares de jogadores. Não apenas onze.

Para quem acha que “o futebol está ficando chato” por causa da luta contra as diferentes formas de discriminação, um recado: chata é a arbitrariedade. Chato é o preconceito. Sem graça é a sua intolerância. Sem eles, o mundo fica muito mais digno, humano e divertido. Essa goleada pode e deve sair de lindos lances coletivos. Com golaços e vitória da democracia.

 

(Fonte:Portal EBC)