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Doze envolvidos em desabamento na Muzema são presos

Uma operação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), com apoio da Polícia Civil, realizada nesta terça-feira cumpriu 12 de 17 mandatos de prisão preventiva contra acusados de exploração imobiliária clandestina na comunidade da Muzema, na zona oeste do Rio de Janeiro. A operação buscou cumprir 17 mandados de prisão e outros de busca e apreensão. Os promotores denunciaram 27 pessoas por participação no grupo, que é acusado de loteamento, construção, venda, locação e financiamento ilegal de imóveis.

O subcoordenador do Grupo de Atuação Especializada em Meio Ambiente (Gaema) do MPRJ, promotor Plinio Vinicius D’Ávila Araújo, disse, em entrevista à imprensa  chamou a atenção dos investigadores o fato de as construções na região da Muzema, na zona oeste da capital, terem sido erguidas em área “impossível de não ser notada”, já que estava próxima de vias movimentadas da região. Para ele, as”obras faraônicas” não poderiam ser realizadas sem a anuência de servidores públicos.

Ligações telefônicas

Ligações telefônicas interceptadas com autorização da Justiça mostram os empresários Bruno Cancella e Leonardo Igrejas comemorando o sucesso de um dos empreendimentos ilegais.

  • Leonardo Igrejas: olha só, deixa eu te falar uma coisa, com toda sinceridade. Ali, o “Espaço Itanhangá” foi um ”negoção”. Foi um ”negoção”.
  • Bruno Cancella: Hã… foi um ”negoção”. Lógico que foi.
  • Leonardo Igrejas: O que não foi um ”negoção” foram os apartamentos.
  • Bruno Cancella: Chefe, eu te garanto que daqui a 90 dias, se “tu quiser realizar dinheiro” com bastante lucro, pode realizar. Porque eu vou vender tudo, pô!

Em outra ligação, Antônio de Brito Machado, um encarregado de obras da quadrilha e que também foi denunciado, alerta um pedreiro sobre uma operação na Muzema que aconteceria dias depois.

  • Antônio de Brito Machado: Pô, tinha que entregar logo a p* desses apartamentos, irmão. Vou até ligar pra Carla aqui. Para a Carla ir na segunda-feira para limpar essa p* aí! Está tudo pronto, pô!
  • HNI: É, mas depois vai sujar, quando ele botar as portas no lugar. Suja tudo de novo.
  • Antônio de Brito Machado: Porque eu tenho que entregar (inaudível) daí, irmão, porque aqui na Muzema está para dar aquele mesmo terremoto que deu comigo e com Bruno (Bruno Cancella, empresário), entendeu? Segunda-feira. E essas p* respinga para todo mundo, para todo lado, e eu quero logo entregar esses apartamentos que foram vendidos, entendeu?
  • A pressa de entregar os apartamentos era para tentar evitar que a obra fosse embargada. Caso os apartamentos estivessem ocupados, seria um empecilho para a prefeitura embargar a obra.

    Em outra ligação, um dos sócios do empresário Bruno Cancella comentou uma reportagem do RJ2 exibida em 2018, que mostrou a compra e venda de imóveis ilegais na Muzema.

    • Leandro Rochmann: “Tu viu” a matéria agora da Globo, cara?
    • HNI: Cara, eu não estava vendo jornal, não. Eu estou na rua. O cara me falou agora.
    • Leandro Rochmann: Po, filmaram ali o terreno do Gabriel, que eu que fiz o negócio, né? Estou com dois apartamentos ali. Filmaram o prédio do Raimundinho. Sacanagem essa p*, entendeu?
    • HNI: É enquanto eles não derrubarem uns prédios aí não vão parar não.
    • Leandro Rochmann : Pô, meu irmão, eles estão querendo é que você vá lá na prefeitura e legalize teu prédio e pague imposto.
    • HNI: Mas não tem como. Eles tratam os cara igual cachorro lá.
    • A Justiça decretou hoje (16) a prisão preventiva de José Bezerra de Lira, Rafael Gomes da Costa e Renato Siqueira Ribeiro pelos crimes de homicídio doloso qualificado, por 24 vezes, lesão corporal, por três vezes, e desabamento, em razão do desabamento de dois prédios residenciais no Condomínio Figueiras do Itanhangá, na Muzema, zona oeste do Rio, onde 24 pessoas morreram. Os três são responsáveis pela construção dos dois prédios que desabaram no dia 12 de abril deste ano, após uma forte chuva na cidade.

A denúncia foi apresentada pelo Grupo de Atuação Especializada em Meio Ambiente do Ministério Público estadual no dia 15 de julho e a decisão foi proferida pela juíza Ariadne Villela Lopes, do 1º Tribunal do Júri da Comarca da Capital. A investigação, conduzida pela 16ª Delegacia de Polícia (Barra da Tijuca), ouviu diversas testemunhas, em especial moradores da localidade e sobreviventes da tragédia.

Os depoimentos apontam os denunciados José Bezerra de Lira e Rafael Gomes da Costa como os responsáveis pelas construções que desabaram e Renato Siqueira Ribeiro como o principal vendedor das unidades imobiliárias. Rafael e Renato estão presos com a prisão temporária decretada transformada pela Justiça em preventiva.

O Ministério Público levantou ainda, nas investigações que Renato Siqueira Ribeiro é o proprietário da Imobiliária Muzema, que funciona irregularmente, pois não possui registro junto ao Conselho Regional de Corretores de Imóveis (Creci).

Por meio de interceptações telefônicas autorizadas pela Justiça, foram reunidas provas de que Renato Siqueira Ribeiro participava do processo de construções clandestinas na comunidade da Muzema, além de ser o maior responsável pelas transações imobiliárias ilegais. Os promotores de Justiça ficaram impressionados com o descaso dos denunciados quanto à segurança das construções, sem a observância de qualquer dos requisitos legais exigidos para o exercício da atividade.

Na denúncia, o Ministério Público argumentou que “para obter o maior lucro possível, abusando da confiança de cidadãos que buscavam realizar o sonho da casa própria, os denunciados construíram edifícios de oito andares, para moradia de centenas de pessoas, sem sequer contratar um engenheiro civil que pudesse atestar a convicção das obras”.

O Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea), atestou que os prédios que desabaram não tinham anotação de responsabilidade técnica (ART). Na denúncia, o MPRJ escreveu “que os denunciados tinham total ciência da fragilidade dos edifícios que construíram, além de total consciência de que esses edifícios estavam habitados e que a ruína dos mesmos causaria a morte de dezenas de pessoas, como de fato ocorreu”. Os promotores informaram que “ainda assim, nenhuma atitude tomaram a fim de evitar a tragédia, demonstrando, claramente, que almejavam a obtenção de lucros a qualquer custo, sem a menor preocupação com a vida humana”.