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Bolsonaro é desmentido em entrevista do seu irmão

Após o presidente Jair Bolsonaro (PSL) dizer durante live no Facebook em que defendeu o trabalho infantil que colheu milho aos “nove, dez anos de idade” em uma fazenda de São Paulo, internautas recuperaram uma entrevista feita com a família do então deputado federal na qual um dos irmãos nega que qualquer um deles tenha trabalhado quando criança.
“Meu pai tinha o estilão dele, boêmio. Mas nunca deixou um filho trabalhar, porque achava que filho tinha que estudar”, disse Renato Bolsonaro , em março de 2015, em entrevista para a revista Crescer . A mãe do presidente, Olinda Bolsonaro, também participou da reportagem e, em certo momento disse que o filho “não era de falar besteira”.

O presidente, durante a transmissão ao vivo, defendeu o trabalho infantil ao usar o próprio exemplo e declarou que “o trabalho dignifica o homem e a mulher, não interessa a idade”, mas que não apresentaria nenhum projeto de lei para descriminalizar a prática por saber que “seria massacrado”.

“Quero dizer que eu, meu irmão mais velho, uma irmã minha também, pouco mais nova, com essa idade, 8, 9, 10, 12 anos, trabalhava na fazenda. Trabalho duro”, acrescentou Bolsonaro , indo no sentido contrário à declaração do irmão.

Em entrevista para a Revista Crescer, em março de 2015, a mãe do presidente, Olinda Bonturi Bolsonaro, e o irmão dele, Renato, contaram memórias que desmentem essas afirmações. Segundo Renato, o pai deles, Geraldo, “tinha o estilão dele, boêmio”, “mas nunca deixou um filho trabalhar, porque achava que filho tinha que estudar”. A afirmação contradiz frontalmente o que foi dito pelo presidente Bolsonaro em sua live nas redes sociais.

Renato conta ainda mais uma parte da história que põe em xeque as afirmações do presidente da República. O pai deles era dentista prático. Embora não tivesse diploma de dentista, fazia todo o tratamento. Isso desde antes de os filhos nascerem. Quando Bolsonaro e os cinco irmãos nasceram, a família, que vivia em Campinas, decide se mudar para o Vale do Ribeira, então lugar pobre, sem dentistas.

“Meu pai pingava de cidade em cidade”, contou Renato. “Quando chegava à cidade, era o salvador. Tirava dente, fazia dentadura, tratamento dentário”, completou. Não parece mesmo o perfil de alguém que trabalhava em uma fazenda colhendo milho ou qualquer outro plantio.

Hoje, a ministra da Mulher e dos Direitos Humanos, Damares Alves, tentou amenizar a situação dizendo que Bolsonaro não quis defender o trabalho infantil. Mas a fala do presidente foi amplamente criticada por afrontar a Constituição e as convenções da Organização Internacional do Trabalho. Ratificadas pelo Brasil, essas convenções dispõem sobre a idade mínima de ingresso no mercado de trabalho aos 16 anos – ou como aprendiz, a partir dos 14 anos.

“Ao defender o trabalho infantil, Bolsonaro também está defendendo a exploração de crianças e adolescentes no tráfico de drogas e a exploração sexual Infantil, que são algumas das piores e mais perversas formas de trabalho infantil”, disse o advogado Ariel de Castro Alves, integrante do Conselho Estadual dos Direitos da Pessoa Humana de São Paulo e ex-conselheiro do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente.

A defesa de Bolsonaro da liberação do trabalho infantil confronta ainda a afirmação do presidente quando questionado sobre o desemprego no Brasil, que em maio já atingia 13 milhões de pessoas.

“Tenho pena, tenho. Faço o que for possível, mas não posso fazer milagre, não posso obrigar ninguém a empregar ninguém”, disse, eximindo-se da responsabilidade pela recuperação da economia e a criação de postos de trabalho no país.

Em nota divulgada nesta sexta-feira (5), a Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) manisfestou repúdio às declarações do presidente da República em defesa do trabalho infantil.

Para a entidade, Bolsonaro demonstra desconhecer por completo a realidade de mais de dois milhões de crianças e adolescentes massacrados pelo trabalho em condições superiores às suas forças físicas e mentais.

A Anamatra lembra, ainda, que o Brasil tem 2,4 milhões de crianças e adolescentes entre cinco e 17 anos trabalhando, de acordo com dados do IBGE (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua 2016), o que representa 6% da população (40,1 milhões) nessa faixa etária. Desse universo, 1,7 milhão exercem também afazeres domésticos de forma concomitante ao trabalho e, provavelmente, aos estudos.

“O que os cidadãos brasileiros aguardam é que o Governo Federal desenvolva políticas públicas de reinserção de 45 milhões de adultos desempregados e subutilizados ao mercado de trabalho.”