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Doulas têm acesso garantido em maternidades do Rio de Janeiro

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A partir de agora, as doulas, profisssionais que dão suporte físico e emocional à mulher antes, durante e após o nascimento da criança terão acesso garantido nas maternidades, casas de parto e hospitais das redes pública e privada. A casa que negar o acesso está sujeita a multa, assim como a doula que se exceder na função. A profissional não ocupa a vaga de acompanhante, também garantida por lei.

É o que diz a Lei 7.314, sancionada sem vetos pelo governador em exercício Francisco Dornelles, e publicada ontem (16) no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro.

Desde 2012, o acesso das doulas a hospitais e maternidades estava proibido no estado por uma resolução do Conselho Regional de Medicina (Cremerj), mas a mobilização de ativistas em torno do parto humanizado levou à aprovação do projeto de lei pela Assembleia Legislativa no mês passado.

Durante o processo, também foi fundada a Associação de Doulas do Rio de Janeiro e feito um abaixo-assinado virtual para defender a causa. A presidenta da entidade, Morgana Eneile, lembrou que a aprovação da lei é fruto de luta e diálogo, “um caso bem-sucedido de organização” de mulheres que tiveram ou conhecem os benefícios do acompanhamento de uma doula. Ela destacou ainda a mobilização das mulheres e o abaixo-assinado, que sensibilizaram o Legislativo para a relevância do tema, até chegar ao “convencimento do Poder Executivo”.

Ao ressaltar que a lei ainda precisa de regulamentação, Morgana disse que as ativistas pretendem colaborar também nessa etapa. “Já entramos em contato com a Secretaria de Governo, pois gostaríamos de colaborar na regulamentação.” Segundo Morgana, é necessário esclarecer também a sociedade sobre a importância do parto humanizado e fazer com que o benefício não fique restrito à capital do estado.

“Dentro da proposta de mobilização das mulheres, é preciso fazer mais campanhas institucionais, contar com mais pessoas para esclarecer o que é uma doula. Como isso pode ser benéfico para a gestante e para o bebê, para que esse binômio, e de que maneira isso pode trazer frutos também para a sociedade, com menos gastos, menos violência obstétrica, com partos menos violentos. É mais uma etapa vencida. Agora vamos ver como se dá na sociedade”, acrescentou Morgana.

De acordo com a presidenta da Associação de Doulas do Rio, poucos estados contam com uma lei que garanta o trabalho dessas profissionais. É o caso de Santa Catarina e Rondônia. Em São Paulo, ainda está sendo discutido o projeto de lei. E algumas cidades também contam com leis municipais.

A mobilização pelo parto humanizado tem crescido no país e o site de abaixo-assinados virtuais Change.org reuniu as petições na plataforma #VaiTerPartoHumanizadoSim. Já são 13 mobilizações ativas relacionadas ao tema, com mais de 50 mil assinaturas no total, tanto de âmbito nacional quanto direcionadas aos poderes municipais e estaduais ou instituições privadas e conselhos profissionais.

Lei que permite acompanhamento de doulas nas maternidades do Rio é aprovada

O Projeto de Lei 2.195/13, que permite o acesso de doulas em maternidades, casas de parto e hospitais das redes pública e privada de saúde do estado do Rio foi aprovado ontem (17) pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) em discussão única. As doulas são profissionais que dão suporte físico e emocional à mulher antes, durante e após o nascimento da criança.

O acesso estava proibido por uma resolução do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj), sendo o Rio de Janeiro o único estado com essa norma. Com o projeto em tramitação, ativistas do parto humanizado reuniram-se com deputados para explicar a importância do projeto e pressionaram para a aprovação, inclusive com sugestões para aprimorar o texto.

Pelo projeto de lei, as maternidades e hospitais serão obrigados a permitir a presença das profissionais durante todo o trabalho de parto, sempre que solicitadas pela gestante, e poderão levar seus instrumentos de trabalho, como massageadores e bolas de fisioterapia.

O texto segue para o governador em exercício, Francisco Dornelles, que tem 15 dias úteis para sancionar ou vetar. Depois, a lei precisa de decreto para ser regulamentada.

Associação

Durante o processo de tramitação do projeto, foi fundada, no sábado (14), a Associação de Doulas do Rio de Janeiro, que tem a participação de, pelo menos, 70 mulheres. A presidenta da entidade, Morgana Eneile, fez um abaixo-assinado virtual no site change.org pedindo a aprovação do projeto de lei. De acordo com ela, as ativistas montaram um dossiê para apresentar aos parlamentares.

“As deputadas, em especial, compraram a briga de pedir o regime de urgência, depois outros deputados foram aderindo. Os deputados da Comissão de Constituição e Justiça iam colocar a proposta como indicação legislativa, uma coisa sem efeito, apenas uma orientação para o executivo. E a gente conseguiu mudar isso”.

Morgana explica que o parto humanizado é um movimento que tem crescido no país, atualmente campeão em número de cesáreas no mundo. De acordo com dados do Ministério da Saúde, os partos cesáreos chegam a 84% dos nascimentos na rede privada e 40% nas unidades públicas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que o número fique próximo de 15%.

“Melhorou pela denúncia do próprio movimento, tem a ver com o crescimento da profissão da doula, as mulheres têm se informado mais, hoje o acesso à informação, com as redes sociais, é facilitado. Nós temos grupos de discussão com mais de 20 mil mulheres. As mulheres passaram a ter mais acesso à informação de qualidade em relação a isso, a entender o que é evidência científica, recomendações da OMS”, disse.

A doula explica que o movimento não é contra o parto cesáreo, “que significou um avanço fenomenal do ponto de vista de evitar morte materna”, mas diz que o procedimento é uma cirurgia de médio porte e não precisa ser indicada com tanta frequência como tem ocorrido no país. “É uma questão de direito de escolha, se ela acha que cesariana é melhor para a vida dela, ótimo, faça, mas as mulheres são levadas a crer que não têm condições de parir, sem ter acesso à informação de que danos isso pode causar”, diz Morgana.

Gestantes do Rio querem derrubar resolução que proíbe doulas em salas de parto

Mãe pela primeira vez, Fernanda França Fernandes, de 33 anos, estava em trabalho de parto há sete horas, quando o processo foi interrompido. Uma enfermeira entrou no quarto para informar que a doula, acompanhante de Fernanda durante a gestão, não poderia ficar para o nascimento. É que o Hospital Municipal Maternidade Maria Amélia Buarque de Hollanda, referência em parto humanizado na cidade do Rio de Janeiro, não pode mais manter doulas em sala de parto, por causa de uma resolução do Conselho Regional Medicina do Rio (Cremerj) que voltou a valer.

Assustada, Fernanda viu o trabalho de parto regredir. Ela ficou preocupada com a possibilidade de ficar sem o acompanhamento da doula, com quem desenvolveu uma relação de afinidade e confiança. Por causa disso, acredita ter ficado mais nervosa, prejudicando o nascimento do bebê, que ficou em trabalho de parto por 24 horas. “Passaram óleo [na barriga], coisas para tentar fazer o trabalho de parto voltar, mas no final, tive que fazer [uso] de ocitocina [hormônio sintético que aumenta o número de contrações do útero] e todas intervenções que eu não queria”, contou.

“Passei a madrugada evoluindo, mas a partir desse momento [do anúncio da retirada da doula da sala], começou a regredir, não digo parar, mas regredir, porque a enfermeira não voltou. A sensação era de que a qualquer momento alguém poderia chegar e mandar ela embora me deixou nervosa e aí, o trabalho de parto parou geral”, acrescentou.

Mesmo sendo referência em práticas de humanização, como permitir a presença regulamentada de doulas, para tentar reduzir as cesarianas, o Maria Amélia teve de se adaptar à resolução do Cremerj.  “Por causa das ameaças de punições a profissionais [pelo Cremerj], a Secretaria Municipal de Saúde suspendeu a permissão à atuação das doulas até que se chegue a um consenso”, informou a secretaria.

Projeto de lei

Preocupadas com o efeito da decisão em outras unidades, mães, gestantes e doulas querem que a resolução do conselho seja derrubada por meio de lei. Elas explicam que doulas dão conforto e segurança às famílias e esclarecem que não interferem nos procedimentos médicos. Para tentar convencer os deputados, elas estarão entre hoje (29) e quinta-feira (31) na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Tramita na casa projeto de lei que libera a presença das doulas.

A médica sanitarista Tizuko Shiraiwa explica que as doulas usam métodos naturais para ajudar as mães, como a indicação de exercícios de respiração, a aplicação de óleo e a ajuda com posições confortáveis na hora do nascimento. “O que as doulas fazem é dar assistência física e emocional às mães. Está mais que provado cientificamente que [a presença delas] é benéfica para mulher. Não vejo em que [isso] pode ser ruim”, disse a médica, que foi coordenadora do Comitê de Mortalidade Materna do Estado do Rio por dez anos.

De acordo com Tizuko Shiraiwa, a decisão do Cremerj, de proibir as doulas em salas de parto, é uma “defesa corporativa”. “As doulas ajudam as mulheres a optar pelo parto normal, o que os médicos não querem fazer porque demora muito e não é remunerado igualmente.”

A Agência Brasil entrou em contato com o Cremerj, mas não conseguiu, durante todo o dia, entrevistar a médica indicada pela entidade. O telefone passado pelo Cremerj não atendeu. Segundo a entidade, só esta profissional poderia falar sobre o assunto.

Após a publicação da reportagem, o Cremerj enviou à Agência Brasil, por e-mail, nota sobre a resolução que veda a participação de doulas no parto. ” [A finalidade é] garantir a melhor assistência às gestantes, sem a interferência na condução do parto, no que diz respeito ao procedimento médico, de profissionais que não possuam profissão ligada à área de saúde e/ou legalizada”, informa o texto do Cremerj.

No comunicado, o Cremerj esclarece que a restrição não se aplica às enfermeiras obstetrizes legalmente reconhecidas. O conselho negou ainda que tenha feito qualquer ameaça a diretores técnicos das unidades de saúde que permitem a participação de doulas nos partos.

O Ministério da Saúde esclareceu, em nota, que a participação de doulas nos partos é “decisão do gestor local” das unidades de saúde. Não há leis ou normas que resguardem a presença das profissionais nas salas e a Lei do Acompanhante dá direito apenas a uma pessoa na sala de parto.

A resolução do Cremerj que proíbe a presença de doulas e/ou parteiras em salas de partos havia sido derrubada na Justiça, antes de o conselho recorrer ao Tribunal Regional Federal do Rio de Janeiro e conseguir reverter a decisão. Caso os médicos sejam flagrados realizando parto na presença das doulas podem até perder o registro.

Outras experiências

Fora do Rio, no entanto, a presença de doulas é incentivada em maternidades. No interior de São Paulo, por exemplo, a contratação delas por um hospital privado reduziu o número de cesáreas, intervenção aconselhada apenas em caso de risco de morte. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o parto normal é mais seguro e deve ser prioridade.

(Fonte Agência Brasil)